Parto Domiciliar - Quando a fuga em frente nos deixa em casa
10-10-2011 11:29O ARTIGO começa em tom ligeiro, tão ligeiro que, de início, ninguém adivinha o rumo que o desabafo vai tomar. Começa com um sorriso suspirado, para acabar numa estrondosa bofetada. São as palavras e a frontalidade de uma mãe que assim desmonta a hipocrisia e o cinismo da assistência ao parto em meio hospitalar. A realidade do sistema de assistência que ela descredibiliza, made in EUA, é em tudo semelhante à nossa e pode, por isso, servir-nos de reflexão.
O abuso obstétrico é, segundo esta voz, o motivo pelo qual mais de 1% das mulheres brancas não-hispânicas opta pelo parto em casa. Fica claro, pelas suas palavras e pela sua perspectiva, que estas mulheres vêem no parto domiciliar mais uma alternativa que uma opção – mais do que querer parir em casa, elas não querem é parir no hospital.
E por cá? Que cores vai tomando o parto domiciliar em Portugal? Quem toma esta opção? Porquê? Em Português, parir em casa é opção ou última alternativa? Quem toma a decisão de parir um filho em casa é mesmo este cenário que busca, ou é ao cenário hospitalar que foge? E em que condições estão estas mulheres a parir em casa? Quem são os profissionais especialistas ou especializados que as acompanham ao longo do trabalho de parto e parto? Com que meios? Com que formação? Que garantia de qualidade têm estes serviços? Como vai correndo esta forma de assistência? Qual a taxa de êxito? E o inêxito? As más práticas e os maus resultados são apanágio exclusivo do parto hospitalar, ou também há registo de maus resultados em meio domiciliar? Em suma, e indo directamente ao que nos interessa: Como são acautelados os interesses de bebés e mães no parto em casa? E se o abuso obstétrico e as más práticas também morarem em casa? Que garantias oferece a fuga ao abuso a que estamos a assistir? Poderá o direito à autodeterminação ser plenamente exercido quando nos limitamos a conhecer e explorar o que não queremos? O inverso do que não queremos será exactamente aquilo que queremos? Representará esse inverso aquilo que temos por “bem maior”, ou, à falta de melhor, é o que nos sobra?
Quando começam a chegar notícias de partos domiciliares medicalizados, desrespeitados e mal sucedidos, é muito importante procurar resposta para cada uma destas questões, sem deixar nenhuma para trás. É nisto que consiste hoje o nosso convite à reflexão.
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